vida

A superfície congelada e fissurada de Europa, vista aqui num mosaico colorido obtido pela sonda espacial Galileu, oculta um oceano líquido que poderá conter todos os ingredientes necessários à vida.

Com base nos planetas ligeiramente maiores descobertos até à data, os astrónomos calcularam recentemente que mais de um quinto das estrelas semelhantes ao Sol albergam planetas habitáveis semelhantes à Terra.

Texto de Michael D. Lemonick

Fotografias de Mark Thiessen

Um sinal electrónico é emitido pelo Laboratório de Propulsão a Jacto (JPL) da NASA, em Pasadena, no estado da Califórnia, e viaja até um veículo robótico fixado na parte inferior de uma placa de gelo com 30 centímetros de espessura num lago do Alasca. O foco começa a brilhar. “Funcionou!”, exclama John Leichty, um jovem engenheiro do JPL agachado numa tenda ali perto, montada sobre o lago de gelo. Pode não parecer uma proeza tecnológica, mas talvez seja o primeiro pequeno passo rumo à exploração de uma lua distante.

Mais de sete mil quilómetros a sul, no México, a especialista em geomicrobiologia Penelope Boston caminha dentro de uma poça de água lamacenta até à altura da perna numa gruta escura como breu, mais de 15 metros abaixo do solo. À semelhança dos outros cientistas que a acompanham, Penelope está equipada com um respirador de grande capacidade e uma garrafa de ar suplementar para fazer frente aos gases venenosos de sulfureto de hidrogénio e monóxido de carbono frequentemente presentes na gruta. Subitamente, a lanterna do seu capacete ilumina uma gota alongada de um fluido espesso e semitransparente escorrendo pela parede calcária esfarelada. “Não é giro?”, pergunta.

Estes dois locais (o lago árctico congelado e a caverna tropical tóxica) podem fornecer pistas sobre um dos mistérios mais antigos da Terra: haverá vida fora do nosso planeta? A vida noutros mundos, seja no nosso sistema solar, seja na órbita de estrelas distantes, poderá ter de sobreviver em oceanos cobertos de gelo, como os de Europa, numa lua de Júpiter, ou em grutas seladas e repletas de gás, que poderão ser abundantes em Marte. Se conseguirmos descobrir como isolar e identificar formas de vida que prosperem em ambientes similarmente extremos na Terra, avançaremos um pouco na busca de vida noutros planetas.

É difícil identificar o momento em que a busca de vida no meio das estrelas deixou de ser um tema de ficção científica, mas um dos marcos fundamentais foi seguramente uma reunião sobre astronomia realizada em Novembro de 1961 e organizada por Frank Drake, um jovem radioastrónomo fascinado com a ideia de procurar transmissões de rádio extraterrestres.

Quando Frank Drake convocou a reunião, a busca de inteligência extraterrestre, ou SETI, “era basicamente um tabu da astronomia”, recorda o astrónomo, actualmente com 84 anos. No entanto, Frank reuniu uma dezena de astrónomos, químicos, biólogos e engenheiros, para discutir aquilo que se designa agora por astrobiologia – a ciência da vida fora da Terra. Mais especificamente, Drake procurava ajuda especializada para determinar se seria, ou não, sensato dedicar tempo significativo de radiotelescópio à captação de transmissões extraterrestres e qual poderia ser a via mais promissora. Numa estimativa razoável, quantas civilizações poderiam existir no espaço exterior? Para tentar chegar a uma resposta, rabiscou uma equação no quadro.

 

NASA

Cientistas do Laboratório de Propulsão a Jacto (JPL) da NASA inspeccionam uma sonda parecida com a que poderá um dia viajar sob o gelo da lua de Júpiter, Europa. 

Esse rabisco, hoje conhecido como equação de Drake, apresenta um processo para responder à pergunta. Começa-se por multiplicar o ritmo de formação de estrelas semelhantes ao Sol existentes na Via Láctea pela fracção do número dessas estrelas que possuam sistemas planetários. Depois, multiplica-se o valor resultante pelo número de planetas com condições favoráveis à vida existentes em média em cada sistema – ou seja, planetas com o tamanho aproximado da Terra que orbitem à distância certa da sua estrela para serem hospitaleiros à vida. De seguida, multiplica-se o resultado pela fracção desses planetas onde surge vida, depois pela fracção deles onde a vida desenvolve inteligência e, posteriormente, pela fracção dos que poderão desenvolver tecnologia para emitir sinais de rádio detectáveis por nós.

Etapa final: multiplicar o número de civilizações conhecedoras de ondas de rádio pelo tempo médio de duração provável da sua emissão ou até da sua sobrevivência.

A equação fazia todo o sentido, mas existia um problema. Ninguém fazia a menor ideia sobre as fracções ou os números da equação, com excepção da sua primeira variável: o ritmo de formação de estrelas semelhantes ao Sol. Se os cientistas do SETI conseguissem captar um sinal de rádio extraterrestre, essas incertezas tornar-se-iam irrelevantes. Mas até isso acontecer, especialistas em cada componente da equação de Drake teriam de tentar resolvê-la apurando os valores – descobrindo o ritmo de ocorrência de planetas orbitando estrelas semelhantes ao Sol ou tentando resolver o mistério de como a vida se enraizou na Terra.

drake

Passou um terço de século até os cientistas começarem por fim a introduzir estimativas aproximadas na equação. Em 1995, Michel Mayor e Didier Queloz, da Universidade de Genebra, detectaram o primeiro planeta orbitando uma estrela semelhante ao Sol, fora do nosso sistema solar. Esse mundo, conhecido como 51 Pegasi b, situado a cerca de cinquenta anos-luz da Terra, é uma enorme bolha gasosa com cerca de metade do tamanho de Júpiter, descrevendo uma órbita tão apertada que o seu “ano” dura apenas quatro dias e a temperatura à sua superfície excede 1.000°C.

Ninguém pensou, por um só instante, que pudesse existir vida em condições tão infernais. Mas a descoberta de um único planeta representou um enorme avanço. No início do ano seguinte, Geoffrey Marcy, hoje na Universidade da Califórnia, liderou a sua própria equipa na descoberta de um segundo planeta extra-solar e depois de um terceiro. Daí em diante, os astrónomos confirmaram a existência de quase dois milhares de exoplanetas, com tamanhos variáveis, desde mais pequenos do que a Terra a maiores do que Júpiter. Outros milhares aguardam confirmação.

Nenhum destes planetas é um equivalente exacto da Terra, mas os cientistas estão confiantes de que não demorarão muito a encontrar um. Com base nos planetas ligeiramente maiores descobertos até à data, os astrónomos calcularam recentemente que mais de um quinto das estrelas semelhantes ao Sol albergam planetas habitáveis semelhantes à Terra. Estatisticamente falando, o mais próximo poderá situar-se a uns meros 12 anos-luz de distância.

Nos últimos anos, os caçadores de planetas descobriram que não existiam razões para limitar a busca a estrelas parecidas com o nosso Sol. “Quando eu andava no liceu, ensinavam-nos que a Terra orbita uma estrela comum, mas é mentira”, diz David Charbonneau, astrónomo em Harvard. Na verdade, cerca de 80% das estrelas da Via Láctea são corpos pequenos, frios, ténues e avermelhados conhecidos como anãs M. Se um planeta semelhante à Terra orbitasse uma anã M à distância certa, ou seja, se se situasse mais perto do que a Terra do nosso Sol, poderia ser um local onde a vida se instalaria tão bem como num planeta semelhante à Terra orbitando uma estrela semelhante ao Sol.

Além disso, os cientistas acreditam agora que um planeta não precisa de ter o mesmo tamanho que a Terra para ser habitável. “Em minha opinião, qualquer corpo com entre uma e cinco massas terrestres é ideal”, diz Dimitar Sasselov, outro astrónomo de Harvard. No fundo, a variedade de planetas habitáveis e as estrelas que podem orbitar é provavelmente muito superior à estimativa conservadora aceite em 1961.

E não é tudo: afinal, o leque de temperaturas e ambientes químicos em que os organismos extremófilos conseguem prosperar também é maior do que alguém presente no encontro de 1961 poderia ter imaginado. Na década de 1970, oceanógrafos descobriram fontes hidrotermais quentíssimas, alimentando ricos ecossistemas de bactérias. Banqueteando-se com sulfureto de hidrogénio e outros químicos dissolvidos na água, estes micróbios alimentam, por sua vez, organismos maiores. Os cientistas descobriram também formas de vida que prosperam em nascentes de água quente, em lagos gélidos centenas de metros abaixo da superfície do manto de gelo da Antárctida, em locais muito ácidos, muito alcalinos, extremamente salgados ou radioactivos, e até em fendas minúsculas no interior de rochas sólidas, um quilómetro ou mais abaixo do solo. “Na Terra, são nichos ambientais”, explica Lisa Kaltenegger, colaboradora da Universidade de Harvard e do Instituto Max Planck de Astronomia, em Heidelberg. “Mas noutro planeta podemos facilmente imaginá-los como cenários dominantes.”

 

microbio

Um micróbio recuperado em 2013 no lago Whillans, 800 metros abaixo do gelo da Antárctida, revela a resistência da vida mesmo em ambientes extremos.

O único factor que os biólogos crêem ser essencial para a vida tal como a conhecemos é a água na forma líquida – um poderoso solvente capaz de transportar nutrientes dissolvidos a todas as partes de um organismo. No que diz respeito ao nosso sistema solar, sabemos desde a missão orbital a Marte, realizada pela Mariner 9 em 1971, que, no passado, a água correu livremente no planeta vermelho. Por consequência, é possível que ali tivesse existido vida, pelo menos na forma microbiana, e é plausível que restos dessa vida ainda resistam no subsolo, onde poderá subsistir água líquida. Europa, a lua de Júpiter, também apresenta sinais de fendas na sua superfície relativamente jovem e coberta de gelo, provando que existe um oceano de água líquida sob o gelo. A 800 milhões de quilómetros do Sol, a água de Europa deveria estar congelada na forma sólida. Mas esta lua contorce--se constantemente sob a força de marés exercida por Júpiter e várias das suas luas, gerando calor que poderá manter a água líquida no subsolo. Em teoria, também poderá existir vida nessa água.

Em 2005, a sonda espacial Cassini, da NASA, detectou a erupção de jactos de água em Encélado, uma lua de Saturno; medidas subsequentemente realizadas pela sonda e comunicadas em Abril deste ano confirmam a existência de uma fonte de água subterrânea também nessa lua.

Titã, a maior lua de Saturno, possui rios, lagos e chuva à superfície. Mas o ciclo meteorológico de Titã é baseado em hidrocarbonetos líquidos, como o metano e o etano, não em água. Poderá haver algo vivo lá em baixo, mas é muito difícil adivinhar o que seja.

Marte é muito mais parecido com a Terra do que qualquer uma destas luas distantes. O veículo Curiosity, da NASA, ainda explora a cratera Gale, onde existiu um enorme lago há milhares de milhões de anos. Existe agora a certeza de que o ambiente químico teria sido favorável à presença de micróbios, caso tivessem existido.

Como é óbvio, uma gruta no México não é Marte e um lago no Norte do Alasca não é Europa. No entanto, foi a busca de vida extraterrestre que levou o astrobiólogo do JPL Kevin Hand e os outros membros da sua equipa, incluindo John Leichty, até ao lago Sukok, no Alasca. A mesma demanda que atraiu várias vezes Penelope Boston e os seus colegas à venenosa Cueva de Villa Luz, uma gruta perto de Tapijulapa, no México. Ambos os locais permitiram aos investigadores testar novas técnicas para procurar vida em ambientes pelo menos vagamente parecidos com aquilo que as sondas espaciais podem encontrar. Em particular, andam à procura de bioassinaturas, indícios visuais ou químicos que assinalam a presença de vida, passada ou presente, em locais onde os cientistas não têm o luxo de realizar sofisticadas experiências de laboratório.

Vejamos o exemplo da gruta mexicana. As sondas orbitais revelaram que existem efectivamente grutas em Marte e que elas são o tipo de local onde os micróbios poderiam ter-se refugiado quando o planeta perdeu a atmosfera e a água à superfície, há cerca de três mil milhões de anos. Estes habitantes das cavernas marcianas teriam de procurar sustento a partir de outra fonte de energia que não a luz solar, como o fluido gotejante que tanto encantou Penelope. Os cientistas referem-se a estas gotas desagradáveis como snottite [ranhite, numa tradução literal]. O nome deriva da assombrosa parecença com muco. Na verdade, trata-se de um biofilme, uma comunidade de micróbios unidos numa substância viscosa e pegajosa. Os micróbios da snottite são quimiotróficos, explica Penelope. “Oxidam sulfureto de hidrogénio (a sua única fonte de energia) e produzem esta ‘gosma’ como parte do seu estilo de vida.”

biofilmes

Biofilmes ricos em micróbios, conhecidos como snottites [“ranhites”], escorrem das paredes sem luz da Cueva de Villa Luz, no México. Alimentando-se de compostos de enxofre, estes micróbios servem de alimento aos mosquitos que habitam a caverna. 

As snottites são apenas uma das comunidades microbianas presentes no local. Penelope Boston defende a existência de cerca de uma dezena de comunidades de micróbios na gruta. “Cada uma tem o seu aspecto físico distinto. Cada uma explora sistemas de nutrientes diferentes.”

Uma destas comunidades é particularmente intrigante para a equipa de investigação. Não forma gotas nem bolhas, mas padrões nas paredes da gruta, incluindo manchas, linhas e até redes de linhas que quase parecem hieróglifos. Os astrobiólogos apelidaram estes padrões de biovermiculações, ou biovermes, abreviando, a partir da palavra “vermiculação”, que significa decorado com “padrões irregulares de linhas, como se produzidos por rastos de vermes”.

Afinal, este tipo de padrões não é criado unicamente por microrganismos que crescem nas paredes das grutas. “Isto acontece numa variedade de escalas, geralmente em locais onde há escassez de um recurso”, explica Keith Schubert, um engenheiro da Universidade de Baylor especialista em sistemas de imagem que visitou Cueva de Villa Luz para instalar câmaras para monitorização a longo prazo do interior da gruta. A flora em regiões áridas também pode criar padrões biovermes, afirma Keith. O mesmo acontece nas crostas do solo, que são comunidades formadas por bactérias, musgos e líquenes que cobrem o deserto.

Se esta hipótese for validada, Penelope, Keith e outros cientistas poderão ter produzido uma descoberta fundamental. Até agora, os astrobiólogos procuram gases como o oxigénio emitido pelos organismos da Terra como marcadores de vida, mas o tipo de vida que produz uma bioassinatura de oxigénio poderá ser apenas um entre muitos.

“Os biovermes entusiasmam-me porque os vemos em várias escalas e em ambientes muito diferentes e, contudo, o carácter dos padrões é muito parecido”, diz Penelope. Para ela e Keith, é altamente plausível que estes padrões, com base nas regras simples que pautam a competição pelos recursos, possam ser, literalmente, uma assinatura de vida universal. Além disso, nas grutas, mesmo quando morrem, as comunidades microbianas deixam um rasto de padrões. Se um veículo pudesse ver algo deste género na parede de uma gruta marciana, “apontaria para o sítio onde devemos concentrar as nossas atenções”, diz Keith.

Na extremidade oposta da América do Norte, os cientistas e engenheiros que tremem de frio no lago Sukok participam numa missão semelhante. Estão a trabalhar em dois locais diferentes no lago, um junto a um aglomerado de três pequenas tendas que os cientistas apelidaram de “Nasaville”, e o outro, com apenas uma tenda, a cerca de um quilómetro em linha recta. As bolhas de metano elevam-se do fundo do lago, agitando as águas. O gelo tem dificuldade em formar-se em alguns pontos. Para percorrer em snowmobile a distância que separa os dois acampamentos, os cientistas têm de utilizar uma rota curva para evitarem um afundamento potencialmente fatal.

Em 2009, foi o metano que atraiu os cientistas a Sukok e a outros lagos dos arredores, no Alasca. Este banal gás hidrocarboneto é gerado por micróbios, conhecidos colectivamente como metanogénios, que decompõem a matéria orgânica, transformando-a noutra potencial bioassinatura que os astrobiólogos podem procurar noutros mundos. Mas o metano também é originado por erupções vulcânicas e outras fontes não-biológicas e forma-se naturalmente na atmosfera de planetas gigantes como Júpiter, bem como em Titã, uma das luas de Saturno. É por isso essencial que os cientistas consigam distinguir o metano biológico do seu primo não-biológico. Para aqueles que, como Kevin Hand, estiverem concentrados em Europa, coberta de gelo, o lago Sukok, rico em metano, não é um mau sítio para molhar os pés.

Kevin é explorador emergente da National Geographic e prefere Europa a Marte como local de prática da astrobiologia por uma razão fundamental. Suponhamos que vamos a Marte e encontramos organismos vivos debaixo da superfície com base em DNA – como a vida na Terra. Isso poderá significar que o DNA é uma molécula universal de vida, o que é possível. Mas também pode significar que a vida na Terra e a vida em Marte partilham uma origem comum. Sabemos que impactes de asteróides projectaram rochas da superfície marciana contra a Terra. É igualmente provável que rochas terrestres tenham viajado até Marte. Se houvesse micróbios vivos aprisionados nestas rochas viajantes e se eles tivessem sobrevivido à viagem, poderiam ter-se disseminado pelo novo planeta. “Se descobríssemos que a vida em Marte era baseada em DNA, acho que ficaríamos confusos quanto a ter ou não existido uma origem de DNA distinta”, diz Kevin. Mas Europa localiza-se a grande distância. A existência de vida em Europa apontaria para uma segunda origem, independente, mesmo que baseada em DNA.

Europa parece possuir os ingredientes essenciais à vida: há água líquida em abundância e no leito oceânico talvez também existam fontes hidrotermais capazes de fornecer nutrientes a qualquer forma de vida. A superfície de Europa é periodicamente bombardeada por cometas que depositam substâncias químicas orgânicas que poderão igualmente funcionar como elementos construtores da vida. Partículas dos cintos de radiação de Júpiter separam o hidrogénio e o oxigénio que compõem o gelo, formando um novo conjunto de moléculas potencialmente utilizáveis pelos seres vivos para metabolizar os nutrientes químicos fornecidos pelas fontes hidrotermais.

Subsiste uma grande incógnita: como conseguirão essas substâncias químicas alcançar o fundo do oceano, atravessando gelo com largos quilómetros de profundidade? As missões Voyager e Galileu tornaram claro que o gelo está crivado de fissuras. No início de 2013, Kevin Hand e Mike Brown, um astrónomo do Caltech, utilizaram o telescópio Keck II para demonstrarem a probabilidade de os sais do oceano de Europa conseguirem ascender até à superfície, possivelmente através de algumas dessas fissuras. E em finais de 2013 outra equipa de observadores, utilizando o Telescópio Espacial Hubble, relatou a existência de ejecções de plumas de água líquida no pólo sul de Europa. Torna-se assim evidente que o gelo de Europa não é impenetrável.

A ideia de enviar uma sonda para orbitar Europa torna-se ainda mais interessante. Infelizmente, porém, a missão avaliada pelo Conselho de Investigação Nacional no seu relatório de 2011 foi considerada demasiado dispendiosa: 3,4 mil  milhões de euros. Uma equipa do JPL chefiada por Robert Pappalardo reconfigurou o projecto e propôs que a sonda Europa Clipper orbitasse Júpiter e não Europa, necessitando de quantidades inferiores de combustível e poupando dinheiro. No processo, faria 45 aproximações à lua numa tentativa de compreender a sua superfície e a composição química da sua atmosfera.

A missão deverá custar menos de 1,4 mil milhões de euros. Se o projecto for aprovado, “podemos prever o lançamento para algures entre o início e meados da década de 2020”, acrescenta Robert. “Se o lançamento for realizado por um foguetão Atlas V, a viagem até Europa demorará cerca de seis anos. “Mas também será possível lançá-la no novo SLS, o Space Launch System, que a NASA está a desenvolver”, diz. “Com ele poderemos chegar lá em 2,7 anos.

Embora seja provável que a Clipper não consiga encontrar vida em Europa, a sonda poderá contribuir para provar a necessidade do envio posterior de um veículo robótico capaz de escavar a superfície e estudar a sua composição química. A Clipper também poderia procurar os melhores locais para pousar esse veículo. A etapa lógica seguinte (o envio de uma sonda para explorar o oceano de Europa) poderá ser muito mais difícil, dependendo da grossura do gelo.

O veículo rudimentar que Kevin Hand e a sua equipa ensaiam no lago Sukok rasteja debaixo de uma camada de gelo com 30 centímetros. A capacidade de flutuação integrada mantém-no firmemente encostado à superfície inferior da camada de gelo e os seus sensores medem a temperatura, a salinidade, o pH e outras características da água. No entanto, não procede à busca directa de organismos: essa tarefa foi atribuída aos cientistas que trabalham actualmente noutra vertente do projecto de Kevin Hand junto ao lago, incluindo John Priscu, da Universidade Estadual de Montana. No ano passado, ele extraiu bactérias vivas do lago Whillans, 800 metros abaixo da plataforma de gelo da região ocidental da Antárctida. Juntamente com a geobióloga Alison Murray e a sua aluna de pós-graduação Paula Matheus-Carnevali, John está a investigar as características necessárias para os ambientes gelados serem propícios à vida e o tipo de organismos que efectivamente os habitam.

Por útil que seja o estudo sobre os extremófilos, ele só pode dar-nos pistas terrestres para um mistério extraterrestre. Em breve, porém, teremos outros meios para preencher as lacunas da equação de Drake. A NASA aprovou um novo telescópio para procurar planetas, o Satélite de Pesquisa de Exoplanetas em Trânsito (TESS). Com lançamento agendado para 2017, o TESS procurará planetas em redor das estrelas vizinhas mais próximas do nosso sistema solar, identificando alvos para os astrofísicos que investigam as atmosferas planetárias em busca de gases com bioassinatura. O Telescópio Espacial James Webb, com lançamento agendado para 2018, também tornará essas buscas mais fáceis.

Toda a atenção nas bioassinaturas e nos extremófilos parte do princípio de que a vida noutros planetas se assemelha à vida na Terra, em moléculas complexas que incorporam o carbono como componente essencial das suas estruturas e utilizam água como solvente. Uma das razões para tal raciocínio é a abundância de carbono e de água na Via Láctea. Outra é não sabermos como procurar vida não baseada em carbono, uma vez que não conhecemos as suas bioassinaturas.

“Se limitarmos a busca, poderemos fracassar”, contrapõe o astrónomo Dimitar Sasselov. “Temos de desenvolver esforços para compreender pelo menos algumas das alternativas e identificar as suas possíveis assinaturas atmosféricas.” Consequentemente, a equipa deste especialista examina biologias alternativas, onde, por exemplo, um ciclo de enxofre talvez exista em substituição do ciclo de carbono dominante na biologia terrestre.

Como pano de fundo de toda esta investigação, mantém-se o projecto que esteve na origem da astrobiologia, há mais de meio século. Frank Drake continua à procura de sinais de extraterrestres, reconhecendo que essa descoberta suplantaria todas as outras. Embora frustrado pelo fim do financiamento ao SETI, Drake mostra entusiasmo por um novo projecto que tentaria detectar clarões de luz emitidos por civilizações alienígenas. “É sensato experimentar todas as abordagens possíveis porque não somos muito bons a adivinhar o que poderão os extraterrestres estar, de facto, a fazer”, afirma ele.

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