gravidez

Fotografia de Istock.

Embora normalmente se resuma a “o óvulo é fertilizado e implanta-se”, o processo que dá início à gravidez é tão complexo como a própria gravidez e frequentemente decisivo para que esta aconteça.

Texto: Noelia Freire

Segundo os especialistas, até um em cada três óvulos fecundados não chegam a implantar-se no útero ou encontram o seu fim num aborto espontâneo, que pode acontecer até antes da implantação. Todo o processo que ocorre desde o momento em que o óvulo sai do ovário até aderir e se implantar no útero é muito mais complexo do que se costuma pensar.

Num momento social como o que se vive a nível nacional e global, com a ciência e a política a empenharem-se cada vez mais em determinar quando a vida realmente começa, conhecer e entender o processo que dá início à gravidez é uma peça-chave do dilema.

Um processo invisível e complexo

Em muitos casos, a educação sexual reduz e simplifica o início da gravidez ao dizer que o óvulo produzido pelo ovário é fecundado nas trompas de Falópio e adere ao útero, onde o embrião começa a desenvolver-se. No entanto, o óvulo tem de passar por uma série de processos até alcançar as condições adequadas para a fecundação.

Da mesma forma, após a união entre o espermatozóide e o óvulo, a viagem pela trompa de Falópio envolve diferentes fases essenciais para o desenvolvimento do zigoto, permitindo que, concluído o processo, uma pessoa obtenha um resultado positivo num teste de gravidez.

O tempo decorrido entre a saída do óvulo do ovário e o momento em que é possível confirmar uma gravidez com um teste é, no mínimo, seis dias. Durante esse período, dá-se a ovulação, a fertilização, a divisão, a viagem pelas trompas de Falópio, a complexidade da entrada no útero e, por fim, a implantação no endométrio.

Dia 0: a ovulação

Para quem possua orgãos genitais femininos, a chegada da puberdade inicia-se com um processo conhecido como ovulação. É a partir deste momento que, nos casos de ciclo regular, um pequeno óvulo que está a desenvolver-se no ovário atinge uma vez por mês o ponto de maturação máxima e abandona a cápsula que o mantém isolado, entrando na trompa de Falópio.

Os óvulos não são produzidos: um indivíduo que nasça com ovários, nascerá já com todos os óvulos que terá ao longo da sua vida, ou seja, entre um milhão e dois milhões. Cerca de mil óvulos são activados em cada ciclo menstrual, mas apenas um (ou em alguns casos dois) alcança o ponto de maturação perfeito para abandonar o ovário.

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Ilustração representativa das fimbrias uterinas. Imagem de Portal Drauzio Varella.

Para sair, o óvulo é transportado pelas chamadas fimbrias uterinas: umas terminações em forma de franja que se encontram na parte mais distante da trompa de Falópio e “abraçam” o ovário. O óvulo passa por elas e desloca-se através das suas terminações até alcançar uma zona bem formada da trompa. O óvulo está protegido por duas camadas: uma mais interior conhecida como zona pelúcida (camada gelatinosa de proteína) e outra mais exterior chamada corona radiata (encarregada da nutrição do óvulo).

A partir do momento em que abandona o ovário, o óvulo tem 24 horas de “vida útil”, durante as quais pode ocorrer a fertilização.

Dia 1: a fertilização

Uma vez introduzido no útero, o espermatozóide sobe até às trompas e desloca-se em busca do óvulo. Se o encontrar, os gâmetas masculinos enfrentam a difícil missão de entrar em contacto com ele. Os primeiros a chegar terão de romper as camadas protectoras do óvulo, ou seja, a zona pelúcida e a corona radiata, sacrificando-se e abrindo caminho para os que vêm no seu encalço.

Depois de um alcançar o centro do óvulo, mais nenhum o fará – e este será o responsável por transmitir o seu material genético. Este momento é conhecido como fertilização, embora seja errónea e popularmente conhecido como concepção, e ocorre menos de um dia após a saída do óvulo do ovário.

Cada óvulo e cada espermatozóide contam com 23 cromossomas com material genético. Quando se juntam, dão origem a uma célula completamente nova, que resulta da união de ambos os materiais genéticos, que conterá os 46 cromossomas ordenados em pares de 23. Será esta combinação da informação genética do óvulo com a do espermatozóide que dará lugar a outra, completamente nova, que definirá as centenas de características do novo indivíduo.

Dias 2, 3 e 4: divisão e viagem

Cerca de 30 horas após a fertilização, o zigoto unicelular começa muito lentamente a dividir-se enquanto se vai deslocando pela trompa. Estas novas células são conhecidas como blastómeros. Nesta etapa da viagem, ocorrem divisões até haver 12 ou mais blastómeros, momento em que sofrem uma compactação e o blastómero passa a chamar-se mórula, cuja forma faz lembrar a de uma amora, com pequenas circunferências unidas. Com efeito, o seu nome vem do latim morula, que significado “forma de amora”.

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Uma mórula vista ao microscópio. Fotografia de Pascal Goetheluck / Science Photo Library.

Durante a viagem ao longo das trompas, as cavidades funcionam como tubos impulsores. As paredes estão repletas de cílios – pequenas estruturas que simulam cordas e vibram, ajudando o óvulo a deslocar-se.

Dia 5: entrada no útero

Quatro dias após a fertilização, os blastómeros da mórula reordenam-se, dando lugar a um novo tipo de conjunto de células conhecido como blastocisto. Este é composto por diferentes partes: uma camada envolvente, uma cavidade interna e uma acumulação celular num dos pólos. Algumas transformar-se-ão na placenta e outras no embrião. É neste momento que o blastocisto chega ao útero e abandona finalmente as trompas.

Enquanto esse processo de viagem e transporte decorria, o útero sofria uma série de mudanças para se preparar para a chegada do óvulo e facilitar a sua implantação. Entre essas alterações, a que mais se destaca é o espessamento do endométrio, um revestimento muscular e oco da pélvis que cobre a parede interna do útero.

Cerca de uma semana após a fecundação, o blastocisto encontra-se na entrada do útero. Se o processo de espessamento do endométrio estiver concluído com sucesso, o blastocisto conseguirá aderir à parede uterina e implantar-se nos dias seguintes, dando início ao desenvolvimento embrionário. A vida útil do blastocisto, ou seja, o tempo durante o qual pode permanecer no útero antes de “morrer” são quatro dias. Se, por qualquer razão, não se implantar até lá, será expulso do corpo sem que a pessoa tenha conhecimento do processo ocorrido.

Dia 6: a implantação

Até este ponto, a pessoa não sente quaisquer efeitos ou sintomas: o processo é invisível até para os médicos. Com a implantação, porém, tudo muda.

Nesse instante, o corpo começa a preparar-se para o desenvolvimento embrionário e o início da gravidez. O sistema endócrino começa a produzir enormes quantidades de hCG, a hormona detectada pelos testes de gravidez, que está presente na urina. É também nesta altura que as pessoas com um ciclo menstrual regular reparam num certo atraso na menstruação, o primeiro sintoma de que a gravidez começou.

 

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