As pessoas que sofrem de depressão sazonal apresentam os mesmos sintomas da depressão clínica, mas melhoram com a chegada das estações mais quentes. Ilustração fotográfica de Chris Fertnig, Getty Images.
O transtorno afectivo sazonal pode ocorrer tanto no Inverno como no Verão. Saiba por que acontece e como pode tratá-lo.
Texto: Sarah Gibbens
Quando se mudou da África do Sul para a cidade de Nova Iorque, Norman Rosenthal reparou que se sentia mais deprimido durante os dias curtos e frios dos invernos da cidade do que no seu país natal.
“Era uma doença que se escondia à vista de todos porque as pessoas diziam ‘pois, é assim que toda a gente se sente no Inverno’. Não a consideravam tratável”, diz Rosenthal, psiquiatra de Faculdade de Medicina de Georgetown.
Em 1984, publicou o primeiro artigo que deu um nome científico à tristeza do Inverno: o Transtorno Afectivo Sazonal (TAS), igualmente denominado depressão sazonal, era um tipo de depressão causado pelos dias escuros de Inverno.
Estudos subsequentes concluíram que esta forma de depressão varia consoante a geografia. Pensa-se que até 3 por cento da população geral seja afectada pelo TAS, mas um estudo publicado por Rosenthal em 1990 concluiu que a condição era mais predominante nas latitudes setentrionais dos EUA, com até 10% dos residentes de New Hampshire a reportarem essa condição.
E, surpreendentemente, cerca de 10 por cento dos pacientes que sofrem de TAS têm sintomas no Verão e não no Inverno.
Seja no Inverno ou no Verão, os especialistas em saúde mental dizem que existem soluções para tratar o TAS.
Tristeza ou TAS
Segundo os especialistas, é normal o humor flutuar com as estações e as pessoas sentirem-se um pouco mais em baixo durante o Inverno. No entanto, aquelas que sofrem de TAS apresentam os sintomas de uma depressão clínica.
“São exactamente os mesmos”, diz Kelly Rohan, psicóloga da Universidade de Vermont e especialista no transtorno.
“Procurávamos coisas como tristeza persistente. Perda de interesse nas coisas. Alterações do sono. Alterações significativas do apetite. Perda de energia. Fadiga. Dificuldades de concentração”, enumera.
Na Clínica de Pesquisa de Depressão de Inverno, em Yale, os sintomas mais frequentemente relatados da depressão de Inverno são a hipersónia – desejo de dormir mais do que o habitual – e aumento do apetite, diz Paul Desan, psiquiatra e director da clínica.
“É como se os seres humanos estivessem a tentar hibernar”, diz Desan.
A maioria das pessoas começa a ter sintomas no início da idade adulta, mas o TAS pode começar em qualquer fase da vida. A condição também varia consoante o sexo.
“Há cerca de três vezes mais mulheres do que homens com TAS por razões que ainda desconhecemos”, diz Desan.
Embora o TAS seja tipicamente diagnosticado quando os pacientes correspondem aos critérios da depressão clínica, alguns pacientes ficam aquém deste diagnóstico oficial. Consequentemente, são diagnosticados com “TAS subsindrómica”, uma condição mais ligeira, mas ainda incómoda.
O que causa o TAS?
“É comummente aceite que a espoleta é a curta duração do fotoperíodo – número de horas entre o nascer e o pôr-do-sol”, diz Rohan. “É o previsor mais forte do início dos sintomas.”
Mas, por que razão exacta é que a menor duração do dia parece tornar algumas pessoas clinicamente deprimidas? “Essa é a pergunta de um milhão de dólares”, diz Rohan.
Uma das principais teorias defende que a alteração na luz do dia afecta a libertação de melatonina, uma hormona libertada pelo cérebro todas as noites para promover o sono. O processo faz parte do nosso ritmo circadiano, o nosso relógio biológico inato que dita quando dormimos e acordamos.
Os cientistas pensam que os dias mais escuros perturbam o ritmo circadiano, levando algumas pessoas a desenvolver sintomas de depressão. Ilustração fotográfica de Jennifer Lee Blanton, Getty Images.
Os nossos relógios estão sincronizados com a luz da manhã, mas à medida que a quantidade de luz diminui durante o Inverno, a melatonina pode ser libertada mais tarde e gastar-se mais tarde, segundo esta teoria.
Isso significa que, “o despertador pode tocar de manhã, mas o corpo ainda está num estado de noite biológica”, diz Rohan.
As pessoas diagnosticadas com TAS podem ser particularmente sensíveis a horários que perturbem o seu ritmo circadiano por começarem e acabarem a horas estranhas, como trabalhos por turnos, acrescenta.
Mesmo segundo essa teoria, ela diz que ainda não se percebe bem por que a perturbação do ritmo circadiano pode conduzir à depressão em vez de causar uma mera sensação de cansaço.
E a depressão de Verão?
Rohan diz que uma minoria de pessoas afectadas pelo TAS no Inverno podem ficar maníacas no Verão, quando o número de horas diurnas estimulantes aumenta.
No entanto, outras experienciam um fenómeno denominado TAS estival – quando os sintomas de depressão sazonal ocorrem apenas durante o Verão, possivelmente desencadeados pelo calor e pela humidade.
Em vez de se sentirem letárgicos, os pacientes de TAS estival sentem-se mais frequentemente irritáveis e agitados.
Os cientistas estão a estudar se o aumento das temperaturas causado pelas alterações climáticas poderá afectar a saúde mental. Um estudo sobre os estados de espírito partilhados nas redes sociais, realizado em 2018, concluiu que a linguagem depressiva aumentava com a temperatura.
O TAS é uma condição real?
O TAS tem os seus cépticos. Um estudo publicado em 2008 examinou taxas de depressão entre populações do norte da Noruega, onde não há luz solar durante dois meses no Inverno, e não encontrou um aumento sazonal.
Outro estudo, publicado em 2016, examinou um inquérito realizado a mais de 30.000 pessoas nos EUA. Nas perguntas relacionadas com a depressão, as respostas não evidenciavam nenhum pico em função da estação ou da latitude.
Steven Lobello, psicólogo da Universidade de Auburn, em Montgomery, no estado do Alabama, não está convencido de que o TAS se qualifique como transtorno mental diagnosticável. Na sua opinião, estudos anteriormente realizados para medir as taxas de TAS foram demasiado sugestivos. Em vez de telefonar às pessoas durante o Inverno e perguntar-lhes se se sentiam deprimidas, os estudos perguntaram às pessoas se alguma vez se sentiram deprimidas durante o Inverno – algo em que muitas pessoas acreditam.
“Se fizermos as perguntas de uma forma que permita às pessoas saber aquilo que estamos a tentar averiguar, acho que não estamos a fazer mais do que avaliar essa crença”, diz Lobello.
Contudo, Rohan diz que esses estudos não podem detectar o TAS porque o transtorno é relativamente raro, representando cerca de 10 por cento das pessoas diagnosticadas com depressão clínica.
“É como procurar uma agulha num palheiro, não encontrar agulhas e determinar que elas não existem”, afirma.
Usando a luz como terapia
Para aqueles que pensam sofrer de TAS, os especialistas dizem que um diagnóstico profissional é um primeiro passo essencial em direcção ao tratamento.
“As pessoas devem mesmo evitar o autodiagnóstico”, diz Rohan. “A depressão é um problema de saúde mental grave, por isso é melhor deixá-lo a cargo de profissionais com a devida formação.”
Ficar sentado diante de uma caixa de luz brilhante é um dos tratamentos mais comuns para o TAS. Os especialistas dizem que o segredo é procurar caixas de luz que emitam luz equivalente a 10.000 lux, uma medida de luminosidade.
“10.000 lux é como estar na rua num dia de Verão em Julho. É muita luz”, diz Desan.
Deve ter em atenção o tamanho da caixa, sublinha. Uma caixa de luz demasiado pequena pode não conseguir fornecer a quantidade adequada de tratamento luminoso.
(O website da sua clínica apresenta uma lista de caixas aprovadas.)
Os especialistas recomendam que se sente em frente uma caixa de luz durante cerca de 30 minutos, geralmente logo no início da manhã, para ajudar o corpo a perceber que é hora de acordar. Este tratamento pode melhorar o humor no dia em que é utilizado. O único problema das caixas de luz, diz Rohan, é só funcionarem no dia da utilização, tendo por isso de ser usadas diariamente.
Psicoterapia e alterações no estilo de vida
Um tratamento que pode ter efeitos duradouros é a terapia cognitivo-comportamental (TCC), um tipo de terapia recomendado por Rohan para o tratamento do TAS.
“Os pensamentos negativos tendem a gerar emoções negativas e queremos transformá-los em pensamentos ligeiramente menos negativos, mais neutros”, diz Rohan sobre a abordagem da TCC. Por exemplo, “odeio o Inverno” poderia ser reformulado como “o Inverno não é a minha estação preferida, mas continua a ter coisas agradáveis”.
Encontrar hobbies de Inverno também pode ajudar.
“As pessoas com TAS têm frequentemente hobbies e interesses específicos do Verão – cultivar a horta e ir à praia”, diz. Em vez de hibernarem em baixo de um cobertor, ela sugere que essas pessoas procurem hobbies agradáveis aos quais possam dedicar-se dentro em espaços fechados – tricotar, aderir a um clube de leitura ou ir ao ginásio.
Alterações ao estilo de vida também podem ser ferramentas mentais úteis, segundo Rosenthal. Fazer exercício, aprender formas de gerir o stress ou planear umas férias num destino soalheiro durante o Inverno pode contribuir para melhorar o humor, afirma.
Quer recorra à psicoterapia ou à terapia de luz, Rosenthal sublinha não haver qualquer razão para não procurar tratamentos para a saúde mental mesmo que os sintomas só estejam presentes durante alguns meses do ano. “Existem muitas estratégias que as pessoas podem usar para as ajudar a viver bem ao longo de todo o ano”.