Um tubarão-anequim surge de repente diante de um intruso, apresentando-se como uma força de peso nas águas ao largo da costa da Nova Zelândia.

Conseguirá o tubarão-anequim, o tubarão mais rápido do oceano, escapar ao nosso apetite?

Texto: Glenn Hodges  

Fotografia: Brian Skerry

Zane Grey ganhou a sua reputação a escrever romances de aventura sobre o Oeste americano, mas a sua verdadeira paixão não era o duelo com pistolas, nem as manobras com vacas: o autor gostava mesmo da pesca em alto-mar. Foi detentor de 14 recordes mundiais de pesca desportiva de peixes de água salgada, incluindo o primeiro marlim com mais de 450 quilogramas pescado com cana de pesca, um espadim capturado no Taiti em 1930. 

O primeiro tubarão-anequim que Zane capturou com a sua cana de pesca tinha 117 quilogramas.

Porém, nada se compara com os tubarões-anequim que ele encontrou ao largo da costa da Nova Zelândia em 1926. O primeiro tubarão-anequim que Zane capturou com a sua cana de pesca tinha 117 quilogramas. Quando o puxou para bordo, “aprendi rapidamente um aspecto sobre o tubarão-anequim”, escreveu no livro “Tales of the Angler’s Eldorado, New Zealand” [sem tradução portuguesa]. “Deu uma luta tremenda, partiu um pucheiro, encharcou-nos de água e não parou de criar problemas.” Quando o tubarão se imobilizou, Zane maravilhou-se com a sua constituição — hidrodinâmico, musculado, com a cabeça semelhante a uma bala. “Nunca tinha visto nada parecido”, escreveu. “Todas as linhas deste tubarão-anequim sugeriam velocidade e força.”
Um dia, Zane encontrou um tubarão com 540 quilogramas que lhe valeria superlativos quase míticos. Após uma longa luta em que “saltou prodigiosamente e deu corridas incríveis”, o tubarão-anequim roeu a linha e fugiu. “Fiquei apavorado. O anequim parecia ocupar o céu. Era a criatura mais selvagem e forte que alguma vez vi e, claro, a mais selvagem e forte que tive presa à linha!”

Quase um século mais tarde, os tubarões-anequim ainda têm uma reputação hercúlea entre os pescadores, que os adoram tanto pela luta que dão como pela sua carne. No entanto, um século de pesca parece ter deixado marcas. O tubarão-anequim distingue-se dos seus primos muito mais raros, da espécie Isurus paucus, pela sua barbatana peitoral mais curta (nesta reportagem, referimo-nos ao Isurus oxyrinchus), entre outros aspectos. É avidamente perseguido por pescadores desportivos e frequentemente pescado como captura acessória por palangreiros comerciais. 

A sua carne rivaliza com a do espadarte em termos de qualidade e as suas barbatanas são valorizadas na Ásia: essa combinação colocou os tubarões-anequim sob grande pressão. 
Na verdade, não sabemos ao certo quanta pressão e, em última análise, quais as consequências de tanto interesse. Os cientistas não têm uma ideia clara de quantos tubarões-anequim existem nos oceanos da Terra e a maioria dos dados sobre as taxas de captura e de mortalidade são fornecidos por operações de pesca comercial – famosas por relatarem valores de pesca inferiores aos reais. Por conseguinte, os biólogos que estudam o tubarão-anequim estão a tentar preencher enormes lacunas no nosso conhecimento.

A sua carne rivaliza com a do espadarte em termos de qualidade e as suas barbatanas são valorizadas na Ásia.

No Verão de 2015, fui convidado a juntar-me a uma operação de marcação de tubarões-anequim ao largo da costa de Maryland com cientistas que tentam preencher algumas dessas lacunas. Pensei que capturaríamos tubarões-anequim de grande porte e que estes encenariam o tipo de espectáculo a que Zane Grey assistiu. Em vez disso, descobri em primeira mão que Mark Twain tinha razão sobre o enjoo em alto-mar (“Primeiro ficamos tão enjoados que temos medo de morrer e depois ficamos tão enjoados que temos medo de não morrer.”). Por isso, decidi experimentar outra vez – desta vez com profilaxia contra o enjoo – em Rhode Island, no fim do Verão. Foi nessa altura que vi aquilo que precisava de ver.
Em ambas as viagens acompanhei cientistas do Instituto de Investigação Guy Harvey, que tentam marcar e acompanhar tubarões-anequim no Atlântico e no golfo do México desde 2008, com o objectivo de estudar os seus padrões de movimento. Os tubarões-anequim da zona ocidental do Atlântico fazem grandes migrações, viajando para norte durante os meses mais quentes e de seguida para sul, quando o Inverno se aproxima.

As excursões ao largo da costa de Maryland em Maio foram um sucesso estrondoso: ao longo de duas semanas, 12 tubarões-anequim foram equipados com transmissores de satélite. Em comparação, as excursões de Agosto em Rhode Island foram um fracasso estrondoso: uma semana, zero tubarões-anequim. Mas esse contraste deu-me uma pista sobre o que pode estar a acontecer aos tubarões-anequim do Atlântico.

Para seguir essa pista, temos de reconhecer a primeira lição: os tubarões-anequim partilham território com o tubarão-azul.

Para seguir essa pista, temos de reconhecer a primeira lição: os tubarões-anequim partilham território com o tubarão-azul. As duas espécies são como leões e hienas, coexistindo nas mesmas áreas com estratégias de alimentação diferentes. O tubarão-anequim é o tubarão mais veloz do oceano, capaz de atingir 55 quilómetros por hora enquanto segue presas rápidas, como anchovas e atuns, e os pescadores desportivos adoram a sua força. O tubarão-azul, em contrapartida, é relativamente pachorrento e concentra-se em presas mais lentas, como as lulas. Nas palavras de um pescador, capturá-lo é como “puxar a porta de um celeiro” e a sua carne não é tão saborosa como a do tubarão-anequim. Por isso, pode imaginar quem é o leão desta analogia e quem é a hiena. Todos querem caçar o leão.

O verdadeiro caçador - Embora não seja tão grande como o tubarão-branco ou o tubarão-tigre, o tubarão-anequim é um dos predadores marinhos mais versáteis. Capaz de atingir 55 quilómetros por hora, é o tubarão mais rápido em distâncias curtas. Como consegue manter a temperatura de zonas do corpo essenciais, pode aventurar-se a profundidades e latitudes demasiado frias para a maioria das outras espécies. Gráfico Fernando G. Baptista e Matthew W. Chwastyk; Lawson Parker; Shizuka Aoki.

No segundo dia após a nossa partida de Narragansett, em Rhode Island, enquanto puxávamos mais um tubarão-azul para bordo, reparei finalmente no óbvio. “Parece que todos os tubarões-azuis trazem anzóis na boca”, exclamei. 
A remoção de um anzol da boca de um tubarão pode ser perigoso e, por isso, os pescadores limitam-se a cortar a linha e deixam os anzóis entregues à ferrugem. Como perseguem os tubarões-anequim, é muito mais provável que libertem tubarões-azuis. “Nunca vi um tubarão-anequim com um anzol”, disse-me o imediato do navio, Lucas Berg, no nosso primeiro dia no mar. 
“As pessoas nunca os libertam. Mas já capturei tubarões-azuis com quatro anzóis na boca.” 

4.000 quilómetros - Distância máxima da migração anual do tubarão-anequim. 100 quilómetros - Distância diária máxima percorrida por juvenis. Gráfico Fernando G. Baptista e Matthew W. Chwastyk; Lawson Parker; Shizuka Aoki.

As pressões exercidas pela pesca sobre os tubarões-anequim são intensas. Muitos nadam para norte junto da costa do Atlântico durante o Verão e, entre a pesca recreativa quotidiana e as dezenas de torneios de pesca do tubarão realizados entre Maryland e Rhode Island, a viagem torna-se perigosa para os tubarões. Muitos são eliminados antes de chegarem às águas setentrionais.
“Este ritmo de pesca é sustentável?” perguntei. Os tubarões-anequim, como muitos tubarões, são particularmente vulneráveis à sobrepesca por terem ninhadas pequenas e atingirem a maturidade sexual numa idade tardia. Um estudo sugere mesmo que as fêmeas só atingem a maturidade perto dos 15 anos ou até mais tarde, mas estes números não são definitivos. 
“Não sabemos”, comentou Brad Wetherbee, ecologista da Universidade de Rhode Island. “São tubarões internacionais que percorrem longas distâncias (alguns [dos marcados] já entraram nas águas de pelo menos 17 países diferentes) e não há dados suficientes para os organismos governamentais responsáveis pela gestão fazerem uma estimativa concreta quanto ao estado da população. 

Segundo o Serviço Nacional de Pescas Marinhas, que regula a pesca nas águas norte-americanas, os tubarões-anequim estão a ser pescados a um ritmo sustentável. Esta avaliação baseia-se sobretudo nos valores das pescas fornecidos pelos palangreiros comerciais à organização internacional que regula a pesca do atum e de outros peixes pelágicos no Atlântico e esses valores indicam uma captura relativamente constante nos últimos anos, sugerindo que as populações de tubarão-anequim estão estáveis. No entanto, esses valores são imprecisos como indicador. A captura é registada em toneladas e pode faltar informação essencial como o número de tubarões capturados e o tamanho e sexo desses tubarões. Além disso, muitas capturas não são relatadas, levando os cientistas a questionar a fiabilidade dos dados e a avaliação das populações.

Segundo o Serviço Nacional de Pescas Marinhas, que regula a pesca nas águas norte-americanas, os tubarões-anequim estão a ser pescados a um ritmo sustentável.

Brad e a sua equipa sabem de facto que a situação dos tubarões que marcaram não é boa.
As marcas de satélite usadas (aproximadamente do tamanho de um isqueiro Zippo e fixadas à barbatana dorsal) transmitem sinais para os satélites sempre que os tubarões vêm à superfície, permitindo aos investigadores a criação de mapas detalhados dos seus movimentos. Quando os sinais começam a vir de terra, eles sabem que os tubarões foram capturados. “Já marquei 49 tubarões-anequim e 11 foram mortos”, resumiu Brad. No mês seguinte, esse número subiu para 12.
É verdade que o tamanho da amostra é pequeno, mas o ritmo de pesca é inquietante.

TUBARÃO-ANEQUIM (Isurus oxyrinchus), ENDOTÉRMICO: Os tubarões-anequim conseguem conservar o calor em algumas partes do corpo. Esta eficiência energética dá-lhes muitas vantagens, como melhor desempenho natatório. O tubarão-anequim e o tubarão-azul partilham as mesmas águas, mas não a mesma fisiologia. O tubarão-anequim tem vantagem substancial sobre a concorrência. 1 - Cauda mais forte: A quilha caudal do tubarão-anequim é plana, suportando as barbatanas e diminuindo o atrito enquanto a cauda se movimenta de um lado para o outro; 2 - Movimentos mais suaves: No tubarão-anequim, o músculo vermelho liga-se à cauda, gerando um movimento suave e eficiente. No tubarão-azul, o músculo vermelho liga-se a outros músculos e à pele, num padrão menos hidrodinâmico; 3 - Mais apetite: A temperatura corporal mais quente do tubarão--anequim aumenta a extensão do seu território, mas o metabolismo rápido implica maior necessidade de alimento; 4 - Mais resistência: Os tubarões dependem do músculo vermelho, composto por fibras de contracção lenta, para as suas migrações. No anequim, o músculo vermelho gera calor e tem mais proteínas; 5 - Aceleração mais rápida: O músculo branco contribui para a aceleração. No anequim, esse músculo assimila rapidamente o oxigénio, permitindo uma recuperação rápida e sprints curtos mais frequentes; 6 - Melhor respiração: A área de superfície das guelras do anequim contribui para a absorção eficiente de oxigénio, depois distribuído pelo sangue. O grande coração bombeia mais sangue; A - Mais calor: Todos os tubarões perdem calor pelas guelras, mas a configuração singular das veias e artérias do anequim permite conservar o calor à volta das vísceras e músculos vermelhos, bombeando sangue quente para o cérebro. Gráfico Fernando G. Baptista e Matthew W. Chwastyk; Lawson Parker; Shizuka Aoki. Fontes: Diego Bernal, Unioversidade de Massachusetts, Dartmouth; Kenneth J. Goldman, DDepartamento de Pesach e Caça do Alasca; Guzmán Díez, AZTI, Divisão de Investigação Marinha; Malcolm Francis, Instituto Nacional de Investigação da Água e da Atmosfera; UICN; Departamento das Pescas e Aquicultura, FAO.

De volta a terra firme, telefonei a Mahmood Shivji, cientista da Universidade Nova do Sudeste que lidera o projecto de marcação. “Espanta-me que, num oceano enorme e com deslocações intensas, esses animais marcados encontrem anzóis de pesca em 25% das ocasiões. Nenhuma população de tubarões pode suportar uma captura anual de 25%.”
Depois do meu cruzeiro enjoado, regressei à costa de Maryland para assistir ao Mako Mania, um torneio anual de pesca de tubarões realizado em Bahia Marina. Este Mako Mania não deve ser confundido com o torneio Mako Mania, realizado em Point Pleasant, nem com o torneio Mako Fever ou com o torneio Mako Rodeo, nem com nenhum dos outros 65 torneios norte-americanos que oferecem prémios pela captura de tubarões pelágicos como o tubarão-anequim, o tubarão-raposo e o tubarão-tigre. 

Cheguei à marina precisamente no momento em que os primeiros tubarões estavam a ser trazidos para as docas. O ambiente era festivo. Ao meu lado, uma mulher e um rapaz viam um tubarão-anequim de 128kg (que venceria a categoria dos tubarões-anequim) içado para a pesagem. Os pescadores reviravam-lhe o focinho para ser fotografado e a mulher disse ao rapaz: “É mesmo fixe, não é?” O rapaz acenou com a cabeça em silêncio, impressionado pelo sangue do tubarão.

Enquanto os tubarões continuavam a chegar, falei com o organizador do torneio, Shawn Harman. “Consegue imaginar coisa mais divertida do que ver tubarões?”, perguntou ele. Quando chegámos a algumas das perguntas mais difíceis sobre a polémica em relação aos “torneios de matança”, como os críticos lhes chamam (em oposição aos torneios “sem matança” ou de “pesca e libertação”, que são raros, mas existem), ele explicou que o seu torneio não era como os de antigamente: nas décadas de 1970 e 1980, os tubarões ficavam empilhados nas docas e depois eram deitados inteiros para o lixo. Aqui, os únicos tubarões trazidos para a doca são tubarões-raposo e tubarões-anequim, os tubarões mais saborosos do oceano, com tamanhos mínimos e um limite de captura diária de um peixe por embarcação. 

Perguntei-lhe onde poderia encontrar tubarão-anequim na ementa para provar e ele foi buscar um filete de um dos tubarões acabados de trazer, passou-o pelas brasas e serviu-mo num pão com maionese de wasabi. Era delicioso.

Perguntei-lhe onde poderia encontrar tubarão-anequim na ementa para provar e ele foi buscar um filete de um dos tubarões acabados de trazer, passou-o pelas brasas e serviu-mo num pão com maionese de wasabi. Era delicioso.
No entanto, a sanduíche saborosa e o ambiente festivo não escondiam a natureza do evento. Mais tarde, nesse dia, um dos pescadores disse-me que um tubarão-raposo de 227kg trazido nesse dia era uma fêmea prenhe e, quando foi esventrada, os funcionários do torneio tentaram esconder as crias dos espectadores. Tal como os anequins, os tubarões-raposo são considerados “vulneráveis” pela União Internacional de Conservação da Natureza. Embora a captura de fêmeas prenhes de espécies vulneráveis seja legal, ela cria má imagem.

Perguntei a um dos homens que limpava o peixe e ele confirmou que havia três ou quatro crias, cada uma das quais com 50cm a 1m de comprimento.

Fiz perguntas a Shawn Harman sobre a fêmea prenhe. Ele negou a história, por isso perguntei a um dos homens que limpava o peixe e ele confirmou que havia três ou quatro crias, cada uma das quais com 50cm a 1m de comprimento. Voltei a falar com Shawn para lhe perguntar porque negara o sucedido. Ele ficou um pouco embaraçado e disse-me que tivera receio de parecer o “mau da fita”. “Estamos a cumprir a lei, de acordo com o que a lei diz ser sustentável”, afirmou. “Se passar a ser ilegal, nós paramos.”
Os comandantes dos navios que realizam as operações de marcação que acompanhei em Maryland e Rhode Island são pescadores de tubarões há muitos anos. Por reflexo, não se opõem à captura e à morte de peixes, nem se deixam abalar pelas implicações da pesca em alto-mar. Ambos os homens sentem apreensão quanto à forma como os tubarões estão a ser pescados.

Mark Sampson, o comandante de Maryland, criou um proeminente torneio de pesca de tubarões em Ocean City em 1981 e organizou-o durante mais de três décadas. Foi ficando preocupado com a conservação das populações de tubarões e restringiu os limites de tamanho de modo a reduzir o número de tubarões capturados. Também insistiu para que os pescadores usassem “anzóis circulares” que, ao contrário dos convencionais “anzóis em forma de J,” não se alojam no estômago do tubarão quando são engolidos, gerando menos mortes desnecessárias. Alguns pescadores mostraram-se relutantes, a participação diminuiu e, devido às limitações impostas aos tamanhos maiores, “tivemos dias de torneio em que nenhum tubarão foi trazido para a doca”.

Foi ficando preocupado com a conservação das populações de tubarões e restringiu os limites de tamanho de modo a reduzir o número de tubarões capturados.

“Isso não é uma receita para um torneio de sucesso porque as pessoas querem ver os tubarões a chegarem e a serem pesados”, disse Mark. Ele encerrou o torneio em 2014 e não aluga o seu barco a pescadores que queiram participar noutros torneios. 
Charlie Donilon, o comandante de Rhode Island, aluga barcos para pesca de tubarão desde 1976. Enquanto Mark é calado e circunspecto, Charlie é loquaz e emotivo e, num daqueles dias de Agosto em que estávamos no navio à espera que os peixes mordessem, contou-me a história de um cliente que pescou um tubarão-anequim que só se rendeu após dar muita luta.
“Atirei-lhe um arpão, depois atingi-o com uma fateixa e depois atei-o a um cunho e ele arranhava e esguichava sangue por todo o lado, enquanto o cliente gravava tudo. Ele enviou-me o vídeo e eu vi-o com a minha mulher, que me perguntou: ‘Isto não te incomoda?’”

Charlie Donilon, o comandante de Rhode Island, aluga barcos para pesca de tubarão desde 1976.

Incomodava, sim, e Charlie começou a tentar convencer os clientes a libertarem os tubarões capturados. “Eu dizia às pessoas que um tubarão-anequim de 45 quilogramas é só uma criança e que eles têm o potencial de crescer até aos 450kg ou mais. Por isso, gostava muito de o soltar porque era um peixe jovem.” Porém, uma vez que quase todos os tubarões-anequim capturados são juvenis, deixou de fazer sequer sentido perguntar isso aos pescadores. A partir de 2015, Charlie Donilon instituiu uma prática de pesca seguida de libertação, sem excepções. O seu negócio sofreu com isso.
Charlie aceita a perda de clientes porque a pesca não lhe parece sustentável por muito que as autoridades digam o contrário. “Os tubarões que marcamos passam por uma peneira quando sobem a costa. Têm de atravessar Maryland, Nova Jersey, Long Island, Massachusetts”, disse. “As fêmeas precisam de atingir, pelo menos, 15 anos de idade para conseguirem reproduzir-se. Quais são as probabilidades de esse tubarão aqui chegar quinze vezes sem ser capturado? Muito reduzidas.”

Pensei em todos os tubarões-azuis que vi com anzóis na boca e pareceu-me que ele tinha razão. Embora a maioria das mortes de tubarões marcados pelo estudo tenham sido causadas pela pesca comercial em águas internacionais (e não pela pesca desportiva), as estatísticas do Departamento de Pescas dos EUA atribuem a maioria das mortes de tubarões-anequim no país à pesca desportiva. Mas quem está a pescar demasiado e onde? Empiricamente, ainda é demasiado cedo para dizer. Charlie Donilon não precisa de esperar por mais dados para proferir o seu veredicto.

“Já causei a minha quota de mortes”, disse-me certa tarde no navio. “Talvez exista um tipo igual a mim em África que era caçador furtivo e costumava matar os leões todos…” E ao dizer isto, os seus olhos encheram-se de lágrimas e a voz começou a tremer, até que acabou por dizer, num suspiro: “Temos de retribuir. Não fazemos outra coisa senão tirar, tirar a toda a hora…” 

Pesquisar