Uma baleia-jubarte ao largo da Antárctida. A espécie é uma das centenas de baleias que foram observadas a alimentarem-se ao largo da ilha Coronation, a norte da península Antárctida, em 2022. Fotografia de Jordi Chias, Nature Picture Library.
Passageiros a bordo do navio National Geographic Endurance encontraram baleias-comuns alimentando-se junto à Antárctida – a maior congregação de baleias de barbas vista em mais de um século.
Texto: Annie Roth
Baleias-comuns a perder de vista, centenas atrás de centenas, a preencher o horizonte com nuvens de ar expirado. Em Janeiro de 2022, junto à Antárctida, os passageiros e a tripulação do navio National Geographic Endurance depararam-se com esta visão mágica, que já não ocorria desde que a caça industrial à baleia levou a espécie até ao limiar da extinção.
“Aquilo que nos saudou enquanto navegávamos para norte da ilha Coronation em 2022 foi inacreditável: um horizonte repleto de bufos de baleia”, diz Conor Ryan, zoólogo e naturalista a bordo do navio de cruzeiro, que é operado pela Lindblad Expeditions.
“Quando nos aproximámos, o som do sopro emitido pelas baleias era contínuo e rodeava-nos, tal como o bafo de baleia condensado na atmosfera, exigindo uma limpeza regular das lentes das nossas câmaras e óculos de sol”, dizia Ryan num email.
Entre 830 e 1153 baleias de barbas, juntamente com algumas baleias-jubarte e baleias-azuis, tinham-se reunido para se banquetearem num banco de krill denso ao largo da ilha Coronation, a norte da península da Antárctida.
Os cientistas da universidade Stanford que analisaram fotografias e vídeos do evento dizem que este enorme grupo de baleias de barbas poderá ser o maior observado desde que a pesca industrial da baleia acabou, em finais do século XX. Anteriormente, o maior agrupamento registado de baleias-comuns fora apenas de 300 animais.
“Há pouco mais de 100 anos ver algo assim não deveria ser muito invulgar”, diz Matthew Savoca, ecologista marinho de Stanford e co-autor de um novo estudo do evento, publicado na revista Ecology.
As baleias de barbas, que chegam a atingir as 80 toneladas, são superadas em tamanho apenas pelas baleias-azuis. Cerca de um milhão destes cetáceos colossais percorriam outrora os oceanos do planeta, mas um século de caça à baleia reduziu o seu número em aproximadamente 98 por cento. A União Internacional para a Conservação da Natureza lista a espécie como vulnerável, embora o seu número esteja a aumentar.
O incrível avistamento fez Savoca, Explorador da National Geographic, afirmar ter ficado optimista com a recuperação das baleias de barbas no oceano Austral. Mas também está preocupado. Uma das ameaças às baleias de barbas é o embate contra navios e o enredamento em equipamentos de pesca e esta baleias foram detectadas no meio de vários navios de pesca industrial de krill.
Preocupações relacionadas com a pesca de krill
“É óptimo que as baleias de barbas estejam de volta e que cada vez mais pessoas consigam testemunhá-lo”, diz Helena Herr, ecologista especialista em mamíferos marinhos do Centro de História Natural da Universidade de Hamburgo, na Alemanha.
A investigadora, que tem realizado extensa investigação sobre as baleias do oceano Austral, diz que as baleias se reúnem frequentemente ao largo da ilha Coronation porque as águas à sua volta são ricas em krill da Antárctida.
Estes minúsculos crustáceos formam a base da rede alimentar do oceano Austral, sendo a presa preferida de pinguins, baleias e lulas. No entanto, as pessoas também têm apetite por krill e anualmente recolhem centenas de milhares de toneladas do oceano para a produção de suplementos alimentares e ração para peixes de aquicultura.
Crustáceos minúsculos denominados krill, na imagem alimentando-se de fitoplâncton, formam a base da rede alimentar do oceano. Fotografia de Paul Nicklen, Nat Geo Image Collection.
A excitação sentida por Ryan e os passageiros do navio de cruzeiro ao avistarem tantas baleias de barbas foi “abalada quando nos apercebemos de que os navios de pesca estavam a arrastar as suas redes no meio do grupo de baleias”, diz. “Foi algo muito chocante de ver.”
Ryan, que também é co-autor do novo artigo, e outros advertem para um aumento de encontros potencialmente prejudiciais com embarcações da indústria de pesca de krill à medida que o número de baleias aumenta – a menos que sejam tomadas mais medidas.
Por exemplo, a Comissão para a Conservação dos Recursos Marinhos Vivos da Antárctida (CCAMLR), que regula a pesca de krill no oceano Austral, deveria ter em consideração as necessidades de segurança e nutrição das baleias, diz Savoca.
Para além disso, a comissão deveria reforçar as regras já existentes, diz Herr. “Há regras que estipulam que a pesca de krill não deve ser realizada na proximidade de baleias ou de outros animais que estejam a alimentar-se”, diz.
Segundo Savoca, a forma como gerimos os bancos de pesca de krill da Antárctida ao longo da próxima década determinará se ajuntamentos como o que foi visto em Janeiro de 2022 se tornam comuns – ou meros acasos.