Gaiolas de peixe em forma de losango são retiradas da água para limpeza numa unidade de aquicultura de peixe em oceano aberto em Colon, no Panamá. Esta é uma de várias abordagens à aquicultura: o cultivo de organismos aquáticos que garante a abundância de alimentos marinhos para as nossas dietas. Fotografia de Brian J. Skerry, Nat Geo Image Collection.
Das algas ao marisco, esta indústria em rápido crescimento está a assegurar que os seres humanos têm proteína suficiente nas suas dietas. Bem-vindos ao universo da aquicultura.
Texto: Hannah Farrow
Pescadores e criadores estão a virar-se para as águas de modo a produzirem proteína para alimentar o mundo – desde peixe a bivalves e algas marinhas.
A aquicultura é a reprodução, criação e colheita de organismos aquáticos em águas doces e salgadas para consumo humano e fabrico de conservas – e as suas implicações são vastas.
Remontando há mais de 4.000 anos, a aquicultura expandiu-se gradualmente da China para o resto do mundo e conquistou a maior parte da sua popularidade no século XXI. Actualmente, é a indústria em mais rápido crescimento de produção de proteína, um dos ingredientes essenciais de nossa dieta.
Esta fotografia aérea mostra barcos na área de aquicultura de Sansha Township durante a manhã, no condado de Xiapu, na China. No pico da época das colheitas de Outono, as embarcações navegam nesta área ampla, colhendo produtos aquáticos como algas e ostras, desde o nascer ao pôr-do-sol. Fotografia de Jiang Kehong, Xinhua/Getty Images.
Além disso, mais de 50 por cento dos alimentos marinhos do mundo são produzidos por aquicultura.
“O debate acabou”, diz Daniel Benetti, director de aquicultura da Universidade de Miami. “Veio para ficar. Já se popularizou.”
À medida que a pesca excessiva ameaça as águas do mundo e as espécies que delas dependem, a aquicultura poderá ser a solução para manter os pescadores no mar e a comida nas nossas mesas. E existem muitos tipos diferentes de aquicultura. Comecemos pelas algas.
Aquicultura de algas
Embora a Ásia seja a maior produtora mundial de algas, estas explorações estão a ganhar tracção pelo mundo fora à medida que o nosso conhecimento do seu valor nutricional aumenta.
As algas marinhas são particularmente fáceis de cultivar, pois não requerem muita atenção para além de algum amor e carinho. A Saccharina latissima, a erva marinha mais cultivada nos EUA, é maioritariamente cultivada em linhas longas, ou cordas horizontais, dotadas de esporos e submersas vários metros abaixo da superfície da água. É uma cultura anual de crescimento rápido e demora dois meses para ser colhida.
Um mergulhador inspecciona kelp criado numa unidade aquicultura ao largo da costa de Vancouver Island, no Canadá. Fácil de cultivar e amigo do planeta, alguns especialistas dizem ser altura de nos virarmos para o kelp para suprirmos as nossas necessidades proteicas. Fotografia de Brian J. Skerry, Nat Geo Image Collection.
Quando está pronta, as linhas são recolhidas e a erva marinha é cortada. A Saccharina latissima é maioritariamente vendida fresca e directamente aos restaurantes.
Os especialistas dizem haver poucas desvantagens no cultivo de algas marinhas. “O cultivo de algas marinhas – e toda a aquicultura marinha – produz muito menos emissões de carbono quando comparado com o cultivo terrestre ou a criação de gado”, diz Anoushka Concepcion, formadora assistente do programa de extensão em aquicultura marinha da Universidade do Connecticut, nos Estados Unidos da América.
Aquicultura de bivalves
Sejam ostras, amêijoas ou mexilhões, a aquicultura ajuda a assegurar que há muito marisco fresco disponível para comermos – e ajuda a manter os nossos oceanos limpos.
Vieiras japonesas prosperam graças a dejectos de peixe numa unidade de exploração experimental instalada ao largo da costa de Vancouver Island, no Canadá. Fotografia de Brian J. Skerry, Nat Geo Image Collection.
Os criadores obtêm bivalves pequenos em incubadoras, onde são reproduzidos a partir de esperma até se transformarem em larvas com um tamanho plantável. Chegados a uma unidade de exploração, os bivalves, tal como as algas marinhas, não precisam de mais alimento, nem de qualquer fertilizante, para além daquilo que o oceano lhes oferece naturalmente. No entanto, têm de ser utilizados diferentes métodos para cultivar cada tipo de bivalve.
Mexilhões: A maioria dos mexilhões são cultivados à superfície da água, em cordas penduradas a partir de uma barcaça ou estrutura flutuante. As linhas são cobertas com larvas de mexilhão e em seguida colocadas na água, onde crescem até atingirem o tamanho comercial (em cerca de dois anos).
Ostras: Alguns criadores cultivam ostras em sacos ou gaiolas que flutuam no topo da água enquanto outros colocam linhas abaixo da superfície da água, quase como se fosse um estendal suspenso com sacos de ostras pendurados. Estes bivalves também podem ser cultivados sem gaiolas ou em sacos no leito marinho.
Amêijoas: As amêijoas são criaturas exclusivamente das profundezas, o que significa que se enterram no leito aquático, quer estejam soltas ou em sacos.
Em locais como a Florida, a criação de bivalves ajuda a limpar inflorescências de algas nocivas conhecidas como marés vermelhas. Embora os seres humanos não possam consumir os bivalves quando ocorre uma inflorescência, a amêijoa acaba por filtrar as toxinas da água e do seu corpo, tornando-se novamente segura para consumo.
As ostras e os mexilhões também costumam ser bons para a saúde dos oceanos. Dependendo do quão grandes e felizes forem, podem filtrar até 190 litros de água por dia, removendo o azoto das águas, ou seja, limpando-as à medida que se alimentam, segundo a Administração Nacional dos Oceanos e da Atmosfera.
Aquicultura de peixe
A aquicultura de peixe é a mais complicada de todas. Desde salmão a peixe-gato e tilápia, os criadores precisam de conseguir controlar ao máximo o ambiente para criarem peixes saudáveis.
Jovens carpas gigantes são criadas em viveiros de terra na estação de campo de Bati, da Administração das Bancos de Pesca do Camboja. Fotografia de Linh Pham, Nat Geo Image Collection.
A maioria destes peixes vem de incubadoras: instalações de criação artificiais onde os peixes eclodem e são criados até atingirem o tamanho aproximado de um dedo. Em seguida, são transferidos para uma unidade onde continuam a crescer até serem colhidos. Dependendo daquilo que o peixe precisar para crescer, a unidade de exploração pode criá-lo em água fria ou quente, doce ou salgada – e em terra, ao largo da costa ou no oceano.
Existem dois principais tipos de aquicultura em terra: viveiros de terra e aquicultura com sistemas de recirculação.
Os viveiros de terra são lagoas naturais onde são instaladas hélices que ajudam a fazer circular a água, mantendo-a fresca e em movimento. Nos estados americanos do Alabama, Arkansas e Mississippi, por exemplo, estas lagoas podem produzir até 11.250 quilos de peixe-gato por hectare, segundo Anita Kelly, professora de aquicultura na Universidade de Auburn — embora sejam vulneráveis às ameaças representadas por peixes, serpentes, tartarugas e aligatores, que se banqueteiam com estes peixes facilmente disponíveis.
Os sistemas de recirculação são, essencialmente, armazéns industriais onde a água do mar é bombeada através de filtros que alimentam as lagoas que albergam os peixes. As águas residuais voltam a ser filtradas e recicladas e são reutilizadas nos tanques.
As explorações costeiras usam sobretudo gaiolas de rede flutuantes – a imagem mais comumente associada à aquicultura. Vistas de cima, estas gaiolas parecem agróglifos aquáticos.
Trabalhadores colhem bagre americano numa unidade de exploração de aquicultura em Itta Bena, no Mississippi. Um dos desafios de criar peixes em viveiros de terra é que eles são mais vulneráveis aos predadores que vivam nas redondezas. Fotografia de Brian J. Skerry, Nat Geo Image Collection.
Por fim, uma exploração de alto-mar é qualquer unidade instalada em águas profundas, diz Benetti. Este é o tipo de aquicultura mais trabalhoso – parte da razão pela qual só existe uma unidade nos Estados Unidos da América, no Havai. A sua gestão exige processos inovadores: os criadores usam gaiolas esféricas que se assemelham a globos metálicos flutuantes com peixes no interior. Embora possam estar ancoradas ou desancoradas, costumam estar ligadas através de um tubo a uma barcaça de alimentação, que bombeia alimento para os peixes.
O futuro da aquicultura
À medida que a aquicultura continua a expandir-se, o mesmo acontece às inovações com ela relacionadas. Em 2022, a China, o principal produtor de peixe de aquicultura, lançou o primeiro navio de aquicultura do mundo. O navio tem 15 tanques – cada um do tamanho de duas piscinas semi-olímpicas — e espera-se que produza cerca de 3.700 toneladas de peixe por ano. Como o navio é móvel, a água para os peixes é constantemente renovada com água do mar, reduzindo o risco de doenças e de poluição aquática.
Um homem rema no seu barco até casa depois de tratar e colher algas marinhas junto à ilha de Coron, nas Filipinas. Fotografia de Rosem Morton.
Os ambientalistas mantêm-se atentos à qualidade da água em redor das gaiolas, pois, segundo eles, o excesso de ração e a concentração dos dejectos de peixe nestes locais podem representar uma ameaça, poluindo ecossistemas vizinhos.
Para reduzir esse risco, algumas unidades planeiam juntar forças. Na Noruega, por exemplo, uma unidade de exploração está a cultivar salmão e kelp na esperança de que o kelp absorva o azoto e outros nutrientes expelidos pelas gaiolas, mantendo assim as águas limpas.
À medida que a indústria da aquicultura continua a crescer a grande ritmo, as experiências acompanham-nas. Ambientalistas e criadores esperam que estas inovações e técnicas ajudem a alimentar a nossa população crescente e talvez até a salvar os nossos oceanos.
Artigo publicado originalmente em inglês em nationalgeographic.com