O aquecimento do planeta está mesmo a ocorrer, mas que animais irão vingar?
30 de Abril de 2021
O aquecimento do planeta está mesmo a ocorrer, mas não se sabe que animais poderão sofrer e quais aqueles que irão prosperar.
Texto Jennifer S. Holland Fotografias Joel Sartore
As condições climáticas alteram-se: é um facto da natureza. Hoje, porém, o clima do nosso planeta muda de forma tão dramática que está a transformar a terra e o mar, afectando todas as formas de vida.
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Este animal tem uma enorme resistência ao calor. No Sudoeste dos EUA e no México, os ratos-cangurus já estão adaptados a condições áridas e sobreviveram em momentos anteriores de aumento de temperatura. São reprodutores rápidos e flexíveis e a sua dieta à base de sementes e insectos dá-lhes espaço de manobra caso alguma espécie de planta ou insecto sucumba ao calor. [Zoológico de Fort Worth, Texas]
Já pressionada pela perda de habitat, a rena poderá enfrentar escassez de alimento. O aumento da neve e da chuva gelada (resultados do acréscimo de humidade no ar seco do Árctico causado por temperaturas mais elevadas) forma uma crosta sobre os líquenes, a base da dieta de Inverno da rena. No Verão, o aumento das secas provoca incêndios que matam os líquenes, um organismo de crescimento lento. [Zoológico de NovaIorque, em Thompson Park]
Vencedores transformados em perdedores: estes pinguins preferem águas abertas a mares gelados, e a sua população registou um crescimento explosivo nos últimos 50 anos de degelo rápido na Antárctida. Agora, porém, o aumento da exposição à luz ultravioleta está a matar as algas consumidas pelo krill e isso significa menos abundância alimentar. Em breve, as alterações ambientais poderão suplantar o turismo como principal ameaça aos pinguins-de-barbicha. [Aquário de Newport, Kentucky]
Nos próximos 70 anos, os lémures de Madagáscar poderão perder 60% do seu habitat devido a alterações climáticas. Se o clima fosse o seu único inimigo, talvez o lémure-de-fronte-branca conseguisse sobreviver, pois as alterações climáticas não reduzirão os seus habitats nas terras baixas e na montanha. Contudo, outros factores poderão fazê-lo, como a agricultura de queimada e o aumento da população humana. [Zoológico de Naples, Florida]
As carraças estão a prosperar. O clima afecta o ciclo de vida da carraça, influenciando a dança intrincada entre o aracnídeo, os hospedeiros infectados e as doenças por si transmitidas. As consequências dos padrões climáticos em mutação são complexas e incoerentes: a transmissão a humanos poderá aumentar em algumas zonas e diminuir noutras. Enquanto isso, no Leste dos EUA, certas espécies, como a Ixodes scapularis, estão a emergir semanas antes da sua hibernação do Inverno e a adaptar-se bem ao novo calendário. [Lincoln, Nebrasca]
À medida que o habitat da tundra derrete, esta raposa encontrará menos carcaças de foca deixadas no gelo por ursos-polares e menos lemingues, que alimentam as suas crias. Esta tendência agravar-se-á nos invernos mais frios. Também poderá enfrentar a concorrência da raposa-vermelha à medida que esta se expande para norte. [Zoológico Great Bend, Brit Spaugh, Kansas]
Os tigres selvagens estão em declínio acentuado, restando possivelmente três mil animais. Um dia, poderão precisar de equipamento de mergulho para viver na região dos Sundarbans, no Bangladesh. Um estudo conduzido pelo World Wildlife Fund prevê um aumento de 28 centímetros no nível dos mares em relação ao ano 2000, que destruirá a maioria do habitat na região. As notícias são melhores no Butão: à medida que as florestas avançam para maiores altitudes, os tigres irão provavelmente avançar com elas, penetrando nos parques do Norte e nos grandes vales fluviais. Infelizmente, se tal acontecer, o tigre forçará a deslocação ou atacará o leopardo-das-neves, animal já em risco. [Zoológico da Costa do Golfo, Alabama]
Alguns antilocapras recuperaram mediante protecção, mas a espécie, limitada à península da Baixa Califórnia Sul, permanece em risco. Restam menos de cem animais em liberdade, juntamente com o contingente em cativeiro, para impulsionar o crescimento da população selvagem. Estes ungulados estão adaptados a condições desérticas, mas o aquecimento persistente e a diminuição das chuvas afectará a sua alimentação de Verão e de Inverno. [Zoológico de Los Angeles, Califórnia]
Este animal endémico da América do Norte é um predador voraz e competitivo que transmite quitridiomicose. Penetrou noutros continentes e disseminou-se como um exército, sobretudo na América do Sul. É, de longe, uma das mais bem sucedidas espécies invasoras do planeta. As alterações climáticas abrandarão o seu avanço em algumas zonas, mas outros habitats com elevada biodiversidade tornar-se-ão mais favoráveis à rã, dando lugar a mais ataques contra espécies autóctones. [Bennet, Nebrasca]
Eis uma ave adaptável que, até à data, tem prosperado num ambiente em mutação. A Sociedade Audubon realizou avistamentos numerosos desta ave limícola no seu recenseamento anual, sobretudo no Sul dos EUA. Em algumas zonas, poderá duplicar o território actualmente disponível para estas aves. Desconhece-se, contudo se irão ou não preenchê-lo e se os verões se tornarão demasiado quentes para elas. [Fotografado no Zoológico de Tulsa]
“Haverá sempre uma minoria de organismos que conseguirá prosperar em condições novas e relativamente súbitas”, diz Thomas Lovejoy, biólogo da Universidade George Mason e fellow da National Geographic. “A vasta maioria, porém, será terrivelmente afectada” ou esmagada.
As temperaturas mais elevadas, provocadas por emissões crescentes de gases com efeito de estufa, são apenas o início desta viagem. Ao longo da rota, há igualmente mais episódios climáticos extremos (incluindo períodos de seca extrema), alterações nas estações de reprodução e migração e na disponibilidade de alimento, novos padrões de doença, fusão acelerada dos gelos e subida do nível dos mares. Cada mudança gera réplicas e os efeitos sucedem-se rapidamente.
“Animais selvagens que gozaram de climas relativamente estáveis nos últimos dez mil anos estão a ser postos à prova como nunca o foram.”
A mudança pode ser positiva para alguns seres vivos. Uma Primavera mais longa, com mais alimento, um nicho para servir de lar ou uma migração desgastante evitada favorecerão o desenvolvimento. No entanto, à medida que as camadas se acumulam umas sobre as outras e o aquecimento continua, os vencedores podem atingir novos limites e perder vantagens competitivas.
Não é apenas uma questão do futuro. Os efeitos das alterações climáticas já se sentem hoje. “Não é possível regredir”, diz James Watson, director do Programa Global para as Alterações Climáticas da Wildlife Conservation Society. “Animais selvagens que gozaram de climas relativamente estáveis nos últimos dez mil anos estão a ser postos à prova como nunca o foram.”
E as nossas previsões sobre “vencedores” e “perdedores” nem sempre estiveram certas. “Raramente nos apercebemos no presente de todas as implicações. A velocidade do degelo polar e as suas consequências [sobre a vida selvagem] têm sido assombrosas” e constituem um bom exemplo da imprevisibilidade de cada sistema. A sensibilidade de vários ecossistemas de coral às mudanças de temperatura e às tempestades é outro exemplo. “Há muitas variáveis em jogo.”
“Um grande esforço de recuperação de habitats poderia implicar menos meio grau de aumento da temperatura causado por potenciais alterações climáticas antes de o aumento acontecer”
A experiência, os modelos e os nossos conhecimentos biológicos podem fornecer-nos uma imagem segura de curto prazo. Que espécies se adaptarão a alterações rápidas? As generalistas, capazes de tolerar um espectro climático amplo. As que estiverem dotadas de genes diversificados e capacidade de reprodução veloz. As que conseguirem mudar-se para um novo habitat e que tenham territórios disponíveis. Espécies competitivas, frequentemente invasoras.
Quais as espécies que serão afectadas negativamente? Organismos especializados, com necessidades climáticas, terão dificuldades. Os que já hoje lutam pela sobrevivência viverão cenários piores. As populações pequenas e fragmentadas, ou confinadas a paisagens pouco cooperantes também. Os animais que competem por recursos com os seres humanos. Grupos sem diversidade genética. Espécies de grande altitude, insulares e vários animais dependentes de coral. As que precisam de gelo para sobreviver.
Não é possível travar este comboio, mas podemos abrandar a sua viagem destrutiva. A recuperação de habitats pode ser uma peça importante deste jogo, até porque a degradação dos ecossistemas foi responsável por boa parte do excesso de dióxido de carbono emitido. “Um grande esforço de recuperação de habitats poderia implicar menos meio grau de aumento da temperatura causado por potenciais alterações climáticas antes de o aumento acontecer”, diz Thomas Lovejoy.
A prevenção de novos danos e cuidados redobrados sobre habitats ainda sobreviventes devem constituir prioridades paralelas. "O melhor que podemos fazer agora" é identificar e proteger as populações essenciais "e tentar impedir a humanidade de estorvar o seu funcionamento", resume James Watson.