praia do caniçal

Há aproximadamente 150 milhões de anos, os dinossauros passeavam por esta região.

Texto: Nuno Pimentel
Fotografia: Alexandre Vaz

Para norte da praia da Areia Branca, encontramos várias pequenas praias selvagens, ideais para passear ao longo do ano ou estender a toalha por uns momentos, a ganhar coragem para mergulhar nas frescas ondas do Atlântico.

Quem sobe ao forte de Paimogo para olhar o mar, fica impressionado com as magníficas arribas que se estendem dali para sul, até perder de vista. São arribas avermelhadas, quase verticais, com riscas mais claras, ligeiramente inclinadas. Na base dessas arribas, vemos uma estreita língua de areia que se estende por mais de dois quilómetros até à praia da Areia Branca. Pequenos esporões rochosos naturais enfrentam e resistem à força das ondas, definindo três pequenas praias contíguas, de norte para sul: Paimogo, Caniçal e Frades.

A praia de Paimogo é a mais estreita, junto ao forte e com acesso por uma rampa empedrada. Lá em baixo, uma pequena casota de pescadores e uma rampa de acesso para os seus barcos marca o local. Nessa rampa, VHILS esculpiu em 2020 o retrato de Saramago para assinalar o dia em que o escritor completaria 98 anos de vida. Todos os dias, a cada maré, as ondas vêm lamber aquela laje, acariciando o rosto do escritor e mostrando-nos a enorme força tranquila de ambos. “Quantas vezes, para mudar a vida, precisamos da vida inteira, pensamos tanto, tomamos balanço e hesitamos, depois voltamos ao princípio, tornamos a pensar e a pensar, deslocamo-nos nas calhas do tempo com um movimento circular”, escreveu Saramago em A Jangada de Pedra.

Mais para sul, a imponência das arribas parece desafiar a possibilidade de conseguirmos chegar lá abaixo e pôr o pé na areia. A meio desta baía natural, vemos que há um pequeno vale que desce até à praia. Esse é o melhor acesso à praia do Caniçal, a maior e mais larga das três, sempre com areia seca, mesmo na maré cheia. Aqui chegados, ficamos indecisos entre olhar o mar ou as arribas. O mar, eterno e omnipresente, mostra-se cheio de sons e aromas, envolvente e inebriante. Depois, somos levados a olhar à nossa volta e atrás de nós, para as arribas de cores quentes e contrastantes com o azul do mar, arribas estáticas e imponentes, também elas eternas, pelo menos na aparência.

A verdade é que estas arribas nos contam uma história e por isso este é um dos principais geossítios do aspirante Geoparque Oeste. Foi por aqui que, há cerca de 150 milhões de anos, passearam, conviveram e lutaram gerações de dinossauros e outros animais pré-históricos. Dessa presença, temos registo através dos importantes fósseis de ossos e ovos, muitos dos quais únicos no mundo. No entanto, a paisagem que eles viam não era esta encantadora praia de areia. Esses dinossauros viveram nas margens alagadiças de grandes rios que corriam das Berlengas para aqui, desaguando para lá da Lourinhã. Desses antigos rios, vemos hoje, nas arribas, as argilas vermelhas depositadas nas lezírias e as camadas de arenitos esbranquiçados e compactos depositados nos canais. As formas suaves e onduladas dos arenitos com sinuosas riscas cinzentas, moldados pela força das ondas, fazem lembrar grandes esculturas de um laborioso artista.

A praia do Caniçal não é para se espreitar. É um lugar para cirandar, para absorver o tempo com calma. O tempo geológico, dos milhões de anos, mas também o nosso, o dos nossos passos e o do nosso olhar demorado pelo mar e pelas rochas.

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