Basta o nome da povoação para remeter para o universo aquático do Tejo e das populações que o rio sustentou.
Texto: Paulo Rolão
Apesar de o nome remeter imediatamente para o maior rio da Península Ibérica e de tudo em Amieira parecer condicionado pelo grande rio, o Tejo não é avistável da aldeia. Para isso, há que ascender ao castelo medieval e subir à sua torre de menagem. A partir daqui, observa-se então o caudal encaixado no vale onde as águas deslizam.
Este ponto de vigia não foi decisivo na consolidação militar do reino de Portugal, mas assumiu importância como centro logístico quando Dom Sancho II entregou as terras desta região à Ordem de São João do Hospital de Jerusalém. Com o tempo, Amieira sofreu diversas remodelações e teve um papel militar em 1440, quando foi cercada durante uma querela com o vizinho reino de Castela.
Nos séculos seguintes, o Castelo de Amieira, erguido segundo o estilo gótico, sofreu alterações significativas. Foram edificadas habitações no seu interior, mas já estavam em ruínas quando ocorreu o terramoto de 1755. Mais tarde, a estrutura serviu de cemitério local até se encontrar um novo espaço de sepultamento. A configuração actual resulta das intervenções de que foi alvo durante o Estado Novo, em meados do século passado, que modificaram muito a estrutura original, mas também contribuíram para a sua conservação.
Ao longo de diversas décadas e décadas a fio, Amieira era um ponto quase incógnito no território nacional e, ainda hoje, é necessário fazer um desvio de vários quilómetros para demandar a aldeia, numa estrada que acaba nela. Essa via alcatroada, contudo, tem uma extensão natural: depois de deixar para trás as ruas e vielas da aldeia, segue para baixo por uma estrada estreita e que contorna os cabeços agrícolas para atingir o cais da Amieira, onde, no passado, se fazia a travessia para a margem oposta e que, actualmente, tem propósitos essencialmente turísticos.
Com efeito, a Amieira Marina possibilita que os interessados percorram as águas do rio numa embarcação dotada de todas as comodidades. Recentemente, o Município de Nisa recuperou a tradição e criou o Trilho da Barca d’Amieira, evocando aembarcação que no passado ligava o apeadeiro ferroviário da Barca d’Amieira e a estrada de acesso à Amieira. O caminhante é hoje convidado a desenvolver um percurso de 3,6 quilómetros, passeando pelo Miradouro Transparente do Tejo, como se caminhasse sobre a água. Os passadiços seguintes conduzem a uma ponte suspensa sobre a ribeira de Figueiró, seguida de observatório de aves e dos meandros do rio. Não se admire se se sentir observado. No céu alentejano, as aves de rapina estão sempre à espreita, observando os intrusos e planeando o jantar.